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Bem vindos ao blog do Frei Flávio Henrique, pmPN

Caríssimos(as),
é, sim, nosso objetivo, "provocar" a reflexão para poder confrontar o modelo mental instalado e o paradigma de conhecimento que se arrasta há mais de cinco séculos, na esteira do renascentismo, do humanismo, da reforma protestante, do iluminismo e de todo processo de construção do conhecimento que atenta contra a Razão sadia - que inexiste sem o discurso metafísico - e contra a Verdadeira Fé, distorcida pelos pressupostos equivocados das chamadas nova exegese e nova teologia. (Ler toda introdução...)


* "PROVOCAÇÕES" MAIS ACESSADAS (clique no título):

*1º Lugar: Arquidiocese de Juiz de Fora reconhece avanço da Obra do Pater Noster...

*2º Lugar: Lealdade, caráter e honestidade... no fosso de uma piada!

*3º Lugar: Fariseu ou publicano, quem sou?

*4º Lugar: Retrospectivas e balanços de fim de ano...

*5º Lugar: “A sociedade em que vivemos”: um big brother da realidade...

* "PROVOCAÇÕES" SUGERIDAS:

*Em queda livre na escuridão...

*Somos todos hipócritas... em níveis diferentes, mas, hipócritas!

*Vocação, resposta, seguimento...

*O lugar da auto piedade...

*A natureza íntima da corrupção...

domingo, 23 de janeiro de 2011

O preço da verdade!

O ser humano possui uma natureza magnificamente complexa, conseqüente de sua condição tripartida, isto é, composta de uma dimensão material (sarx) e de uma dimensão espiritual (lógos), ambas interligadas por uma dimensão intermediária - ao mesmo tempo que é produzida por ambas -, a dimensão emocional (psiquè).

O ordenamento adequado destas dimensões do ser uno requer um exigente processo de desenvolvimento. O correspondente deste ordenamento na linguagem secular é o que comumente se chama consciência. Na espiritualidade cristã há um método – que funciona como uma muito eficaz ferramenta de ordenamento – que se chama ascese.

A ascese consiste, de forma muito simplificada, num mecanismo de abstenção contínua dos impulsos da vontade por força de um ato de Fé. O correspondente no campo da razão seria a sensatez com motivação ética. Num ou noutro caso a consciência se desenvolve na direção do progresso interior do homem.

Em ambas as vias, para que o homem consiga qualificar sua natureza aproximando-se da verdadeira estatura de sua humanidade – a estatura de Cristo, Ecce Homo – o processo é exigente, laborioso e sofrido.

É sofrido porque requer grande esforço, perseverança e, principalmente, deposição honesta da auto-suficiência.

No campo da razão temos o testemunho de um grande filósofo clássico, que no mergulho sem volta na apreensão da verdade, não mede esforços para esvaziar-se da pretensão de saber:

“Só se que nada sei” (Sócrates)

Frase de efeito? Elucubração filosófica? Discurso com propósito político de convencimento da consciência alheia, mesmo pensando o contrário?

Negativo. Trata-se de uma autêntica, genuína e honesta percepção do mecanismo íntimo para se atingir - verdadeiramente - a realidade das coisas. Sem subterfúgios e sem falseamento ou distorção de seus significados mais essenciais e absolutos.

Esta conclusão indica um despojamento franco, a partir do qual se é possível estabelecer um parâmetro confiável para o homem desenvolver uma consciência real sobre si mesmo. E isto se dá em razão do fato de que, um dos principais inimigos da verdade – o orgulho – é vencido no âmago do ser, ou seja, na sua capacidade de escolher como olhar para o mundo que o cerca.

Só mesmo alguém comprometido com a verdade, até o ponto de sorver cicuta (veneno tomado por Sócrates em sua pena de morte – cf. Fédon, Platão), aceitando a pena do juízo alheio para conservar a coerência com a lógica do raciocínio em favor da verdade, pode ser convincente para além dos próprios interesses.

Este é o caminho da autenticidade segundo o viés da Razão.

Não é diferente segundo o viés da Fé...

Vamos explorar mais detalhadamente a mesma coerência com a verdade – acima dos interesses pessoais e coletivos – na perspectiva da Verdadeira Fé.

E, neste aspecto, nenhum exemplo é mais completo que aquele protagonizado pelo Autor mais lido e vendido da história...

Detalhe: sem jamais ter escrito uma única linha...

Ou melhor, para esvaziar-Se, inclusive, da pretensão de assinar Sua Sabedoria com os critérios dos homens, escreveu, sim... na areia...

E, claro, o que escrevera, apagou-se... nem a Escritura Sagrada revela o que fora...

Isso, sim, é que é esvaziar-Se de Sua condição, Verdadeiramente Divina e Verdadeiramente Humana...

Se você não concorda comigo, por gentileza, cita-me um autor - por pouco vendido e lido que seja - que não assina sua obra...

...

... hum!

... hummmmm!

Nem mesmo eu, que busco diuturnamente a renuncia de mim mesmo, farei isto ao fim desta reflexão...

Já que você não vai encontrar ninguém para citar com honestidade ou com perfeita capacidade histórica de substituir Aquele que escreveu o Evangelho - com a vida - e o assinou com Seu Sangue, então, vou prosseguir...

Compreendamos a inerência lógica da Verdade Revelada no raciocínio de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Leiamos atentamente:

“Eis que vos dei poder para pisar serpentes, escorpiões e todo o poder do inimigo. Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos estão sujeitos, mas alegrai-vos de que os vossos nomes estejam escritos nos céus. Naquele mesma hora, Jesus exultou de alegria no Espírito Santo e disse: Pai, Senhor do céu e da terra, eu te dou graças porque escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, bendigo-te porque assim foi do teu agrado.” (Lc 10, 21) (grifo nosso)

Consideremos analiticamente...

Ora, levemos em conta o expressivo significado simbólico de “serpentes e escorpiões” na Escritura Sagrada. Lá estes símbolos significam a figura do mal. Sendo assim, se alguém for capaz de derrotar esta realidade que tanto prejuízo traz à humanidade e possuindo força para aniquilar “TODO PODER DO INIMIGO”, como não alegrar-se com este feito?

Há nisto uma estupenda revelação da natureza íntima das conseqüências do saber e do poder, quando apropriados pela égide humana.

Por que razão alguém com o magnífico poder de pisar nas “serpentes”, isto é,

“o grande Dragão, a primitiva Serpente, chamado Demônio e Satanás, o sedutor do mundo inteiro. Foi precipitado na terra, e com ele os seus anjos.” (AP 12, 9)...

... deveria não se alegrar pela sujeição de tais espíritos, se a eles é devido a origem do mal?

Derrotar o mal fora de si e tragá-lo para dentro de sua consciência não é propriamente uma vitória sobre o mal.

E como isto seria possível de acontecer a quem foi capaz de “pisar serpentes, escorpiões e todo poder do inimigo”?

A alegria por este feito, sendo maior que a alegria de ser contado entre os eleitos - não por mérito, mas por Graça - é a porta de entrada para o orgulho. E, o orgulho, como dissemos, é uma poderosa semente do mal. Nele está sua desgraçada dinâmica.

Dessa forma, a lógica do ensinamento de Nosso Senhor Jesus Cristo, na perspectiva da Fé, tem correlação com a lógica socrática, na perspectiva da Razão. Com isto é possível se compreender porque não se deve alegrar com o “poder para pisar serpentes, escorpiões e todo o poder do inimigo”.

Quem não se envaidece com o poder do conhecimento atingido pela Razão ou com o poder espiritual atingido pela Fé, merece este justo, honesto e exultante louvor dirigido a Deus por ninguém menos que “Seu Filho bem amado”:

“Pai, Senhor do céu e da terra, eu te dou graças porque escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, bendigo-te porque assim foi do teu agrado.” (Lc 10, 21)

Razão e Fé não se opõem. Complementam-se. Há, contudo, que estarem sujeitas, ambas, ao ordenamento hierárquico da estrutura una do ser, tripartida em corpo, alma e espírito, para não falsearem-se.

Aliás, a Fé Verdadeira como a Razão sensata, são produtos de uma escolha que inclui, sim, emoções e sentimentos, mas não o contrário, isto é, de uma escolha baseada na ausência de lógica das emoções e dos sentimentos.

Mais que explicar, através da lógica reflexiva, os mecanismos internos do bem e do mal no ordenamento interior do homem, apresentaremos dois exemplos que testemunham a formidável força da Ação da Graça nas disposições retas e humildes de gente santa, que merece o louvor do Filho de Deus.

Conta a biografia de São Luiz Gonzaga que certa ocasião o Santo encontrava-se na Capela, ao cair da tarde, mergulhado na contemplação, adorando o Santíssimo Sacramento. Teria feito nesta ocasião uma experiência íntima sublime de comunhão com Deus.

A narrativa da história diz que a certa altura do seu mergulho contemplativo, experimentava tamanho gozo do silêncio na presença do Santíssimo Corpo de Deus, que o coaxar dos sapos e o estrilar dos grilos o perturbaram. Levantou-se, dirigiu-se à porta da capela e ordenou:

_ Calem-se!

Subitamente todos os bichos calaram-se. O religioso prostrou-se novamente diante do Santíssimo Sacramento para retomar o gozo contemplativo no silêncio absoluto. Ao contrário do que esperava, começou a perturbar-se interiormente. A paz de espírito fora substituída por uma alegria que logo se transformou numa convulsão de vaidade. Imagine: ele ordenou que as criaturas se calassem e elas se calaram. Não podia conter a alegria do feito, que rapidamente afagou-lhe soberbamente o ego.

Mas, como santo não é inerrante, mas, bem ao contrário, é aquele que erra e reconhece seus erros, incomodado com os sentimentos que se lhe despertara na alma, São Luís desfez seu ato. Levantou-se prontamente, dirigiu-se uma vez mais à porta da Capela e disse:

_ Criaturas de Deus, voltem a louvá-lo!

Percebe como pensa e age um santo?

Alegra-se mais com a realidade que lhe escapa do que com o poder que exerce. É humilde mesmo tendo conhecimento e força superiores à maioria dos mortais. É a eles que se dirige o Louvor do próprio Criador e que nunca é demais repetir:

“Pai, Senhor do céu e da terra, eu te dou graças porque escondeste estas coisas aos sábios e inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, Pai, bendigo-te porque assim foi do teu agrado.” (Lc 10, 21)

Gostaria de me deter, por último, num exemplo mais contemporâneo. Igualmente nobilíssimo. É o caso da Irmã Lúcia, uma das videntes de Nossa Senhora, em Fátima, Portugal.

Este é um estupendo caso de humildade. Consideremos as circunstâncias. Três crianças no início do século vinte recebem a visita da Mãe de Deus. Duas morrem e uma permanece. Um grande fenômeno não natural marca os eventos. As profecias vão se cumprindo na história: as guerras mundiais, os erros do comunismo esparramados pela Rússia, etc. No mundo inteiro se esparrama a devoção de Fátima como um fenômeno.

Enfim, o mais incrivelmente e inusitado fato ocorre: a Igreja reconhece oficialmente as aparições e mensagens da Virgem Maria como autênticas. Em dois milênios de História, a Igreja reconhece como Revelação Pública oficial apenas três casos: Lourdes, Guadalupe e Fátima.

Dá para perceber a importância disto?!

E isto com a jovem vidente Lúcia em vida!

Foi encaminhada para o convento, à revelia da sua vontade. Resignou-se, sofreu, obedeceu. Permaneceu viva e escondida do mundo na clausura. Imagine: tornou-se famosa em toda terra. Lida e comentada em todos os escalões da sociedade. Reconhecida pela pesadíssima estrutura da Igreja como uma vidente autêntica. Não era um embuste ou uma farsa. Mesmo assim, recolheu-se na ningueindade (única expressão que gosto de Rubem Alves).

Quem de nós, reles mortais, no lugar dessa alma nobre, não lutaria contra as estruturas de poder para fazer valer o espaço conquistado pelo Poder que ela recebera do Alto?

Eu também te louvo, ó Pai, porque revelastes estas coisas aos pequeninos e escondestes dos sábios e poderosos...

A verdade tem um preço: o nosso escondimento... a renúncia de nós mesmos.

Mas, os exploradores da verdade não querem pagar este preço. Ao invés disto, eles manipulam oportunistamente a verdade que aprendem, distorcendo-a segundo o jogo dos interesses e do poder temporal.

Não vou dizer que estou excluído deste mecanismo de perfídia. Mas, estou em busca deste Caminho. Pouco a pouco, por meio de inenarráveis penas temporais, estou me deixando amalgamar por este processo laborioso de renúncia de mim mesmo.

Ferramentas como o uso sensato da Razão e a ascese espiritual pela Fé, vão construindo passo a passo uma espiritualidade vigorosa e eficaz: a espiritualidade de kénosis, ou do esvaziamento, inaugurada na História do Cristianismo pelos Santos Padres do Deserto.

Muito bem! É isto! Já me decidi a fazer este exigente percurso, sem tréguas e sem regalos, afinal, a Fé não é fruto de uma emoção interior. É fruto de uma escolha sóbria e árida:

“A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê(Hb 11, 1) (grifo nosso)

A verdadeira fé não pode partir do que se vê, nem do que se sente, etc. A verdadeira Fé tampouco ignora a Razão. Antes, parte dela. É um ato de escolha, calcado na Razão, não contra ou fora dela. Ninguém pode ter ou exercer a Fé - Dom da Gratuidade Divina – se não possuir o uso sensato da Razão.

Um louco não pode ter Fé. Assim como não pode ter um boi ou qualquer outro animal irracional. A Fé é manifestação da racionalidade humana. Quando a Fé é guia dos sentimentos e emoções - através da Razão - ela é sadia. Se, ao contrário, a Fé é guiada pelas emoções e sentimentos, ela não só é doentia como torna a própria Razão uma louca dentro de um sanatório pensante, onde falta bom senso e adequado juízo crítico.

Mais uma vez não se trata aqui de simplesmente eliminar os sentidos do psiquismo, que são parte integrante do ser uno, mas, de ordená-los segundo a hierarquia da natureza humana.

Este é o tributo honroso à verdade. Quem não paga este preço, com a decência da livre escolha, é ladrão de si mesmo. É usurpador das coisas Divinas. É mercenário da Razão. É assassino da Fé!

Pe. Frei Flávio Henrique, pmPN

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