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Bem vindos ao blog do Frei Flávio Henrique, pmPN

Caríssimos(as),
é, sim, nosso objetivo, "provocar" a reflexão para poder confrontar o modelo mental instalado e o paradigma de conhecimento que se arrasta há mais de cinco séculos, na esteira do renascentismo, do humanismo, da reforma protestante, do iluminismo e de todo processo de construção do conhecimento que atenta contra a Razão sadia - que inexiste sem o discurso metafísico - e contra a Verdadeira Fé, distorcida pelos pressupostos equivocados das chamadas nova exegese e nova teologia. (Ler toda introdução...)


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sábado, 9 de outubro de 2010

Somos todos hipócritas... em níveis diferentes, mas, hipócritas!

A hipocrisia dos hipócritas e dos não hipócritas... A que grupo pertencemos?

Isto mesmo. Há duas espécies básicas de hipocrisia. A hipocrisia dos hipócritas e a hipocrisia dos não hipócritas.

Como???

Hipocrisia dos hipócritas? Isto não é redundância absurda?

E hipocrisia dos não hipócritas, isso é possível? Se não são hipócritas, como podem cometer hipocrisia?...

Explico-me... ou ao menos tentarei...

Comecemos primeiro por recordar o significado de hipocrisia.

Algumas boas definições encontradas para hipocrisia são:

  • ação contrária àquilo que o agente prega, acredita ou pensa;
  • vício que consiste em apresentar uma virtude, um sentimento que não se tem.

Se há dois tipos de hipocrisia, há em cada tipo, dois modelos de hipócritas.

Vamos aos hipócritas do primeiro tipo de hipocrisia, a dos hipócritas assumidos:

Primeiro caso: hipócritas por excelência - Entre os que cometem hipocrisia por serem hipócritas há os que o fazem negando peremptoriamente serem pessoas falsas, dissimuladas. Mentindo para si mesmos, tentam ludibriar a todos de sua real condição de fingimento. Fingem sobre a verdade de si mesmos. Falseiam-na. Dizem não ser o que de fato são com juras constantes de serem o que não são. Sua hipocrisia consiste em negar a dissimulação que lhes causa prazer, satisfação, gozo íntimo, realização. De fato, são ases do engodo. Mestres da enganação. Fazem da fraqueza ou inclinação um meio sem limites para extrair algum tipo de satisfação pessoal;

Segundo caso: hipócritas por profissão – Em geral, estes hipócritas, num lance genial de autenticidade, admitem-se hipócritas como qualquer um o é. Contudo, percebendo-se falido na vontade de não ser hipócrita, faz do vício - de parecer ser o que não é - uma ferramenta de trabalho para atingir metas específicas. Consegue, neste caso, estabelecer algum tipo de controle sobre esta força da viceralidade que coloca a vontade em guerra com a razão, a realidade do ser em pé de igualdade com a ilusão do não ser.

Baseado na premissa íntima de que é mais autêntico por admitir-se também hipócrita como qualquer outro, o hipócrita por profissão, entende-se – sem que necessariamente perceba isto – um hipócrita menos hipócrita. Dessa forma de hipocrisia confrontada por certa autenticidade, o homem tira de si mesmo – ou de uma fraqueza ainda maior que a sua – forças para configurar-se ao super homem nitiniano, apostando todas as fichas de sua existência no buraco negro e com ocaso perpétuo de que tudo é um grande nada.

Em todo caso, entre os dois modelos possíveis na hipocrisia dos hipócritas, há um denominador comum, não obstante, cada qual difere do outro em razão de como lida com a própria hipocrisia. Ambos acabam aceitando, de certa maneira pacífica, sua condição de comportamento. Ainda que sofram com a realidade do que se tornam comportamentalmente, eles transformam a dor e a angústia desse mecanismo intrínseco em fontes de realização. Aprendem a sentir prazer e satisfação com suas hipocrisias administradas com maior “coerência” e “verdade” (como querem crer os hipócritas por profissão) ou com inconseqüência e total engano (como não se importam em negar os hipócritas por excelência). Curiosamente, ambos abominam odiosamente não apenas a hipocrisia alheia, mas, sobretudo, todo esforço moral – individual ou coletivo - para vencer a hipocrisia universal.

Agora, vamos à hipocrisia dos não hipócritas. Também nesta forma de hipocrisia há dois casos distintos de hipócritas.

Primeiro caso: hipócritas por falênciaestes, embora também realizem o ato hipócrita de apresentar uma atitude ou um sentimento que não possuem, normalmente, não se sentem bem com este estado de impotência. Apesar de não aceitarem tal comportamento, mergulham num torpor de humilhação por serem o que não queriam ser, de agir como não queriam agir e, como consequência, entram em estado de falência da vontade. Isto significa que não encontram forças para evitar a recorrência dos atos falhos de hipocrisia.

Como no caso dos hipócritas por excelência, os hipócritas por falência, não conseguem admitir sua hipocrisia, com a larga diferença que não transformam esta condição num comportamento padrão para se atingir gozo, prazer, realização, satisfação, etc. Ao contrário, tendem a ser depressivos, enquanto os hipócritas por excelência tendem a ser ansiosos.

Segundo caso: hipócritas por contingência – O hipócrita dessa estirpe é o que mais padece a luta interna entre o bem que gostaria de realizar (sem conseguir com perfeição) e o mal que gostaria de evitar (sem êxito pleno). Este hipócrita tem de comum com os demais o fato de, de um modo ou de outro, não conseguir aplicar com perfeita coerência as aspirações, idéias, vontades, sentimentos, pensamentos, enfim, as virtudes que anseiam. Em razão dessa semelhança com os demais casos de hipócritas, passaremos a considerar, a seguir, com maior atenção, as diferenças entre este caso de hipócrita e os demais apresentados anteriormente.

Como nos três casos anteriores, o hipócrita por contingência é vítima de um mecanismo universal que circunscreve todo homem, sem exceção fora dos modelos propostos pelo Cristianismo (o Unigênito de Deus e Sua Santíssima Mãe, ambos, preservados por Desígnio Divino para o bem do gênero humano, já marcado por origem pela deficiência do erro). Este mecanismo universal que circunscreve todo homem a Fé chama de pecado e, a Razão, chama de vício moral.

A fé e a ética são recursos que o hipócrita por contingência busca dentro e fora de si para conter este movimento dinâmico que torna seu comportamento diferente, na prática (ação), do que gostaria que fosse, na sua vontade, pensamento ou sentimento (teoria).

E é o uso destas ferramentas que marca a primeira grande diferença entre o hipócrita por contingência dos outros três casos de hipocrisia.

Vejamos a comparação caso a caso.

O hipócrita por contingência, diferentemente do hipócrita por excelência, não se rende com volúpia ao teatro de máscaras postas sob as falhas de o seu real sentir, pensar, etc. Ao contrário, por mais que seja derrubado na desleal luta entre o fio de sua vontade de evitar o mal comportamental e o grande estímulo interno e externo para lucrar facilidades com a dissimulação, ele levanta-se indignado primeiramente consigo mesmo - e também com o estado geral das coisas - e decide prosseguir tentando. Mesmo que se convença de que sua luta será vã. E este apego à idéia de rejeição aos apelos para as benesses temporais do fingimento, custa-lhe, a cada vez, uma vida inteira de penoso esforço existencialmente sujeito à novas falhas.

Para os céticos, este penosíssimo esforço que rejeita - no âmago da consciência - o suborno dos prazeres temporários, transformando o infeliz hipócrita por contingência, num austero juiz de si mesmo, o qual pune sua contingente hipocrisia com a aridez mais atacâmica do deserto dos sentidos, esse sujeito, não passa de um Dom Quixote, que faz dos apelos mais recônditos, moinhos inexistentes de vento divino.

Também o hipócrita contingente, difere do caso com quem divide maior semelhança, a saber: o hipócrita por falência. Assemelha-se dele no fato de que não faz da hipocrisia um meio para “se dar bem na vida” (por isto os denominamos hipócritas-não hipócritas), como o fazem os hipócritas-hipócritas.

Tal qual o hipócrita por falência, o hipócrita por contingência padece a humilhação interna de ser assim por circunstância de sua natureza quedante. Todavia, diverge eficazmente daquele que é seu semelhante (quanto ao estado íntimo de humilhação, o falido), por não entregar-se ao torpor da depressão.

Luta, fragilizado é verdade. Igualmente impotente, é necessário frisar. Mas, da destruição causada pela recorrência do vício, remexe os escombros da existência para tentar reconstruir sua identidade em busca daquilo que lhe escapa pela greta da vida como a água escapa pela greta dos dedos: a autenticidade.

Não chega a ser, necessariamente, por esta insistência teimosa e muitas vezes tristemente presunçosa, um herói ou um santo. Mas, seguramente, tem maior chance de se tornar mais humano, embora, não o suficiente para atingir, ainda, a humanidade primeva, dita adamítica. Não deixará de ser, por isto, um ser humano melhor que antes ou, ao menos, “menos pior”...

Deixamos por fim a comparação entre o hipócrita por contingência e o hipócrita por profissão. Entre ambos há uma diferença diametral, antagônica, inconciliável, diria, absolutamente eterna.

Se não se é possível encontrar o bem absoluto no homem, tanto quanto não é possível haver nele o mal incorrigível, fato é: tudo, no hipócrita por contingência, escolhe livremente apontar para o Summum Bonum (Sumo Bem); assim como, no hipócrita por profissão, todo escolhe apontar livremente para a privatio boni (ausência do bem ou propriamente o mal em seu único significado ontologicamente possível).

Se, de um lado, há fumaça indicando verdade - na forma mental do hipócrita por profissão – em razão de encontrar alguma autenticidade ao admitir em si a hipocrisia inevitável a todos, é certo que não existe nenhuma labareda de verdade na escolha de gerenciar esta condição, em prol de promover o “bem” de si mesmo, de seus interesses e daqueles que são escolhidos para participação no “paraíso” dos prazeres e das realizações à revelia do Bem Supremo.

Aliás, mesmo que esta hipocrisia fosse administrada tendo em vista o propósito do bem comum ou Maior, se, a atitude de hipocrisia, fosse buscada objetivamente para atingir-se este fim, ela seria deplorável de per si, em razão de que não se trata, neste caso, de uma contingência limitante, mas, de uma malícia que define a estirpe do verdadeiro mau caráter. Este é o péssimo princípio filosófico da política de Maquiavel, em que os fins justificariam os meios.

Em suma, o que o hipócrita por profissão possui como autenticidade legítima é a antinomia peremptória com relação às escolhas e decisões - também frágeis – do hipócrita por contingência.

Aquele que estabelece sua hipocrisia no território orgulhoso do ego que submete, na medida de interesses localizados, idealiza-se a si mesmo – com ou sem consciência maior ou menor disto – no seguimento do anticristo personificado na bíblia niilista de Nietschez.

Ao invés, o hipócrita por contingência, seguro de não possuir autenticidade plena, esmerilha com vigor o rosto inacabado de sua existência – ainda em desenvolvimento até atingir a estatura do Ecce Homo – palmilhando, as quase apagadas, pegadas históricas do Único Redentor.

Embora errando recorrentemente o caminho ao enveredar-se por atalhos de vontade própria, o hipócrita por contingência, estabelece sua hipocrisia no território humilhado do ego que se submete à vergonha de se portar como não gostaria de comportar. Mas, não se detém no fundo deste poço. Com a nobreza de não desistir na busca de força - dentro ou fora de si - mira o Verdadeiro Auter (Outro). E, tomando este modelo trans-épico, reergue sua liberdade para escolher retornar na direção de um seguimento de decisões semelhantes às testemunhadas por Cristo, Encarnado como Homem, tal qual na Bíblia dos Cristãos que não protestam contra si mesmos, contra todos os outros nem contra Deus!

Enfim, todo homem é hipócrita, tendo em vista o limite patente que faz com que, mesmo em suas retas disposições, tenha grande chance de se distanciar da realidade, a qual, às vezes, cobra dele o preço de suas justas e honrosas conquistas, caso insista em sustentar com coerência a máxima autenticidade. Nesta hora, entre o direito de manter as sofríveis conquistas e o dever de honrar algum valor, o senso de justiça interior pode enganar com sutileza a consciência e sugerir-lhe uma minúscula dissimulação em favor da automanutenção.

Sendo assim, estando o homem sujeito a agarrar-se na segurança de suas principais escolhas, por coerência ou por conveniência, está fadado a maquiar sua existência, no mínimo, com a sombra de uma ou outra atitude hipócrita, por muito que possua grande caráter.

Ora, se tal é a condição do homem, isto significaria que esta é sua realidade ontológica, isto é, isto faz parte de sua natureza substancial?

Não! Comportamento é relativo à escolha. E, escolha, embora, muito influenciada pela inclinação sócio-cutural de todos os povos e raças, tem níveis diferentes de decisão. Logo, apesar de toda humanidade estar inclinada severamente para hipocrisia, os graus de participação nela distinguem-se do pior para o melhor, conforme casos e circunstâncias específicas.

Dito tudo isto, algumas questões finais desta provocação reflexiva:

- em qual dos casos de hipocrisia nos enquadramos?

- por que razão nós devemos arremessar nossas escolhas com tanto vigor contra nossas consciências, admitindo-nos, de algum modo, hipócritas?

Quanto à primeira questão, prefiro desferir um golpe duro e solitário: solitário no sentido de não incluir ninguém neste severo julgamento antes de incluir a mim mesmo como principal objeto para autoanálise (sugiro que você faça o mesmo em relação a você); duro no sentido de desferir este golpe contra minha própria consciência e acusar-me com intrepidez, tirando a doída conclusão de que não atreveria absolver-me de ter me comportado em quaisquer destes casos, em medidas e ocasiões diferentes (pelo menos possa ter pertencido num momento mais remoto que atual).

Mas também não posso ser hipocritamente modesto e não considerar que, as minhas potentes angústias e insistentes reações cheias de esperança de mudança, na esteira da severidade com que procuro julgar a mim mesmo, permitam-me acreditar que, ao menos no campo do desejo (apesar de todas as forças fracassadas da minha existência), eu pertença ao rol dos hipócritas por contingência.

E ao desferir tão violento golpe contra minha própria face, acerto, de quebra, a boca injuriosa daqueles que - hipócritas por excelência ou por profissão - beijam-me a outra face como Judas, o traidor, beijara a Face do Único Personagem Histórico no qual nenhuma hipocrisia foi encontrada, causa fatídica de Sua condenação.

Pe. Frei Flávio Henrique, pmPN

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