Certa noite,
noite como tantas outras...
... em meio à falta de luz,
no escuro,
vi com clareza a minha escuridão.
Esta visão foi tão nítida...
... tão clara...
... que...
até mesmo aquilo que parecia claro no meu pensamento...
escuro ficou.
O que escuro já era no interior do meu ser,
transformou-se num lampejo de sombra opaca.
Reflexo fosco e embaçado de um entendimento obscuro.
Somente dúvidas.
Intensas dúvidas.
Num esforço desumano,
para tentar enxergar algum fato com clareza...
...o piscar intermitente de algumas certezas,
exclusivamente de fé pois,
a razão de todos,
consumiu a energia dos meus direitos.
Imputaram-me somente deveres.
Leis.
Todas a punir-me com violência pelo aparente reflexo do meu existir.
As trevas do juízo humano...
Sim, o juízo alheio...
escondeu na escuridão as retas intenções do meu...
... do meu coração.
Mais que esconder...
Sepultou...
numa cova negra e funda as rarefeitas disposições de vencer minhas falhas estruturais...
Coração que se tornou enegrecido por um sangue pisado...
... pisado pelo ciúme, despeito, inveja...
Enfim, pela hipocrisia dentro e fora de mim...
Eu sei.
Culpa da minha franca abertura ao desconhecido...
... ao Misterium.
Também de minha parte,
o meu juízo alheio a mim sobre mim mesmo...
O implacável juízo de minha própria vaidade...
“Vaidade. Tudo é vaidade”.
“Vaidade das vaidades”.
Dúvidas?
Certezas?
Trevas?
Luz?
Quem sobrepuja quem?
São as trevas que embaçam e sombreiam a luz da fé com a “certeza” da vontade própria? ...
... ou ...
... é a Luz da fé que rasga o véu racional das trevas do duvidoso conhecimento humano a respeito do que seja realmente bom ou mal?
Em verdade, em verdade...
... a “certeza” aparente do juízo alheio,
não tem dúvidas em sentenciar os que tentam justificar-se pela fé.
Prega-os na cruz da existência,
oferecendo-lhes o vinagre da amargura cítrica do desdém, do escárnio, da indiferença...
para calar o silêncio que perdoa sem limites...
Entre umas e outras...
que opção consciente fazer?
Se...
... na mais aguda asfixia causada pelas trevas interiores...
a própria Verdade parece exprimir a experiência da dúvida...
e grita:
La ma zabactani? (Por que me abandonaste?)
Que dúvida fenomenal!!!
De fato,
é o paradoxo do maior de todos os fenômenos...
... a Absoluta Razão escolhe não responder à dor atroz do abandono sem antes recorrer ao mais perfeito ato Fé:
... “em tuas mãos entrego o meu espírito”...
Em comunhão de fé com todos,
que igualmente foram esvaziados de si pela tenacidade do abandono de Deus e dos homens...
... eu...
... sem o auxílio da clareza racional estabelecida pelos meus semelhantes...
...renuncio,
na escuridão da razão e da fé que aplacam o meu ser,
a todos os convites hipócritas que desejam retirar-me das noites escuras da incompreensão alheia.
Prefiro - tentando seguir o Pobrezinho de Assis - fazer da morte, invés de inimiga, ao menos prima, já que, como ele o fizera, não consigo ainda acolhe-la como irmã...
Como resposta a estes sedutores de vanglória terrena,
uma dura constatação...
... amam somente a si mesmos.
Com lábios sedutores,
aliciam as almas puras para uma “comunhão”,
onde a regra é a defesa dos interesses próprios,
embora,
no discurso,
juram,
falsamente,
priorizar o interesse alheio.
Pois sim...
...prefiro vagar no abandono e no desprezo.
Mesmo sem saber explicar,
como eles tentam fazer,
eu,
simplesmente creio que...
... quando finalmente,
estas sombras tenebrosas se aplacarem definitivamente sobre o lânguido brilho solitário da fé...
que conservou-se num ponto de luz no fundo de minh’alma...
romperei as cadeias que cercam o embate dialético entre o bem e o mal para...
experimentar...
em plenitude...
o que sobrevém deste estado temporário de morte...
... a Vida!
Pe. Frei Flávio Henrique, pmPN
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